Prática de agricultura regenerativa no Cerrado brasileiro pode gerar US$ 100 bilhões e impulsionar PIB do Brasil

Estudo do BCG, MAPA, WBCSD e CEBDS aponta que 32 milhões de hectares de áreas agrícolas no Cerrado podem ser regenerados até 2050
São Paulo, março de 2025 – Um novo relatório do Boston Consulting Group (BCG), em colaboração com o Ministério da Agricultura e Pecuária do Brasil (MAPA), o World Business Council for Sustainable Development (WBCSD) e o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), revela que a agricultura regenerativa no Cerrado brasileiro representa uma oportunidade de até US$ 100 bilhões em valor econômico (VPL) e pode impulsionar o PIB brasileiro em US$ 20 bilhões anualmente até 2050.
De acordo com o estudo, intitulado “Cultivando a resiliência: um caminho viável para regenerar paisagens no Cerrado brasileiro”, a conversão para terras agrícolas já consumiu quase metade da área original do Cerrado com um aumento de 71% nas taxas de conversão apenas entre 2019 e 2023. Como consequência, incêndios se tornaram mais frequentes e intensos, espécies de plantas e animais estão ameaçadas de extinção e o clima na região está se tornando mais quente e seco, impactando diretamente a produtividade agrícola da região.
Para mudar esse cenário, o BCG recomenda a adoção de práticas agrícolas mais resilientes que podem conciliar o aumento de produtividade com sustentabilidade. O levantamento identifica 32,3 milhões de hectares no Cerrado com potencial para práticas regenerativas, divididos entre 23,7 milhões de hectares para recuperação de pastagens degradadas – taxa interna de retorno (TIR) de 15% a 22% de 7 a 9 anos – e 8,6 milhões de hectares em terras cultivadas para intensificação de práticas sustentáveis (TIR de 16% a 29% em 3 a 5 anos).
“É necessária uma estratégia integrada de investimentos, combinando capital privado, concessional e seguros, e que potencialize as vocações do bioma para produção agrícola. Nossos números mostram que isso é possível. O produtor brasileiro tem demonstrado que produção e eficiência andam de mãos dadas com práticas sustentáveis. Com a COP30 no Brasil, é um momento ideal para estabelecermos definições, padrões e métricas conjuntas entre os setores público e privado, criando as condições para investimentos em larga escala e incentivando aqueles que produzem preservando solo, recursos hídricos e a biodiversidade”, explica Lucas Moino, sócio do BCG.
Atualmente, a Action Agenda on Regenerative Landscapes (AARL) e seus parceiros já estão mobilizando US$ 6 bilhões em investimentos em agricultura regenerativa globalmente. O Cerrado, com seu vasto potencial, tem a oportunidade de liderar essa transformação e se tornar um modelo global, demonstrando a viabilidade da agricultura regenerativa em larga escala.
Dessa forma, além dos ganhos econômicos, a adoção de práticas de agricultura regenerativa no Cerrado pode gerar benefícios ambientais e sociais significativos, incluindo a redução de emissões de carbono em até 140 MtCO2e, a melhoria da saúde do solo, o aumento da biodiversidade, a maior eficiência hídrica e o aumento da renda para até 400 mil agricultores.
“A mobilização em torno da COP30 representa uma janela de oportunidade estratégica para superar desafios e acelerar a expansão da agricultura regenerativa no Brasil. Aproveitando esse momento, o Landscape Accelerator – Brazil (LAB), uma iniciativa do BCG, WBCSD e CEBDS, já está promovendo alinhamentos essenciais no setor privado. Um passo fundamental nesse processo será o AARL Brazil Summit, que acontecerá em abril no oeste da Bahia, em parceria com o Ministério da Agricultura e Pecuária. O evento marcará um avanço significativo na construção de consensos com produtores e sociedade civil sobre políticas públicas, financiamento e sistemas de métricas e monitoramento para o setor”, contextualiza Marcelo Behar, conselheiro sênior do WBCSD e CEBDS.
“A transição para paisagens regenerativas representa não apenas uma oportunidade econômica sem precedentes, mas um imperativo para a resiliência climática e competitividade do agronegócio brasileiro a longo prazo. O Brasil tem uma chance única de liderar este movimento global, e o LAB está criando as condições para que o país chegue à COP30 com um modelo já em implementação, demonstrando na prática que produção e conservação podem caminhar juntas”, afirma Juliana Lopes, diretora de Natureza e Sociedade do CEBDS.
Desafios
O estudo mostra ainda que a expansão da agricultura regenerativa no Cerrado apresenta três desafios principais:
- Ativação dos agricultores. A transição exige uma mudança de mentalidade, priorizando maiores margens e produtividade no longo prazo ao invés de ganhos imediatos. Pequenos agricultores enfrentam barreiras como falta de acesso a especialistas, redes de apoio e programas personalizados, além de obstáculos linguísticos e educacionais. O ceticismo sobre a viabilidade econômica e o apego cultural às práticas tradicionais reforçam a resistência à mudança. O estudo aponta que é fundamental iniciar a adoção pelas práticas que o produtor já associa a benefícios financeiros, como plantio direto, bioinsumos ou intensificação das pastagens.
- Financiamento da transição. A transição para a agricultura regenerativa exige investimentos iniciais significativos em infraestrutura, insumos e equipamentos, além de capacitação. Além disso, os maiores retornos financeiros são tardios, exigindo acompanhamento técnico contínuo para evitar uma possível queda nos lucros nos primeiros anos, dificultando a adoção. Instituições de crédito veem essa transição como arriscada, tornando o financiamento caro ou inacessível. Sem alternativas viáveis de crédito ou reservas financeiras, muitos agricultores não conseguem assumir sozinhos os riscos da transição, apesar dos benefícios a longo prazo. Para isso, o estudo aponta que são necessários mecanismos mistos de capital filantropo, concessional e seguro, combinados com o empréstimo de capital ao produtor, além de suporte agronômico para a transição.
- Verificação de práticas e resultados. A verificação da adoção e eficácia da agricultura regenerativa é um processo complexo e custoso, exigindo tecnologias avançadas, auditorias e ferramentas digitais. Para pequenos agricultores, os altos custos e a burocracia podem ser impeditivos, dificultando o acesso a mercados premium e incentivos. A falta de métricas e protocolos padronizados agrava o problema, tornando o sistema fragmentado e confuso. O estudo aponta a necessidade de um alinhamento entre os diferentes atores da cadeia em torno de métricas acessíveis e passíveis de monitoramento no curto prazo, como análises espaciais. Já métricas de longo prazo, como a medição direta da concentração de carbono, só podem ser avaliadas no médio e longo prazo.
Essas dificuldades – enraizadas na falta de confiança, restrições financeiras e requisitos complexos de verificação – estão profundamente interligadas e exigem uma compreensão abrangente das barreiras enfrentadas pelos agricultores, que são fundamentais para essa transformação. Enquanto o Brasil se prepara para sediar a COP30, o Cerrado oferece uma visão convincente para um futuro sustentável. Ao abraçar a agricultura regenerativa e fomentar a colaboração entre todos os setores, há potencial para que esse bioma se torne a primeira paisagem regenerativa do mundo, mostrando um modelo para equilibrar a produtividade agrícola com a preservação ambiental.
O estudo completo está disponível no site do BCG.